O Judiciário deve decidir sobre as medidas flexíveis de combate ao COVID-19

STF traçou o comando de que as normas estaduais e municipais baixadas para as atividades não essenciais devem se pautar em dados científicos.Com o artigo intitulado “A Constituição, o Supremo e a competência concorrente legislativa” [1], publicado em 13 de abril último, lançamos breves linhas sobre nossa preocupação para “qual dosagem, proporção, amplitude e razoabilidade é admitida a competência concorrente legislativa, inclusive a denominada suplementar” [1].

E assim fizemos com preocupação que nos atormentava à época para a cautelar parcialmente deferida nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 6341, particularmente em seu primeiro momento, pois o Ministro relator asseverou a necessidade de “tornar explícita, no campo pedagógico, a competência concorrente” [2] para adoção de medidas legislativas restritivas baixadas para combate à COVID-19.
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão datada de 15 de abril deste ano, à maioria de votos, ratificou a medida parcialmente deferida, fazendo asseverar que A Corte enfatizou que a emergência internacional, reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), não implica, nem menos autoriza, a outorga de discricionariedade sem controle ou sem contrapesos típicos do estado de direito democrático. As regras constitucionais não servem apenas para proteger a liberdade individual e, sim, também, para o exercício da racionalidade coletiva, isto é, da capacidade de coordenar as ações de forma eficiente. O estado de direito democrático garante também o direito de examinar as razões governamentais e o direito da cidadania de criticá-las.
Os agentes públicos agem melhor, mesmo durante as emergências, quando são obrigados a justificar suas ações. O exercício da competência constitucional para as ações na área da saúde deve seguir parâmetros materiais a serem observados pelas autoridades políticas. Esses agentes públicos devem sempre justificar as suas ações, e é à luz dessas ações que o controle dessas próprias ações pode ser exercido pelos demais Poderes e, evidentemente, por toda sociedade. [1]
Firmou a Corte o entendimento de que estados e municípios, não obstante a edição de Decreto e Lei federal, poderiam e podem sim editar regramentos restritivos de combate ao coronavírus, desde que amparados em dados científicos.
O embate, hoje, não é mais discutir a competência dos governadores e prefeitos para a edição de medidas restritivas, mas para a normatização que afrouxe as regras anteriormente postas.

Cremos que o raciocínio lógico-legislativo-jurisprudencial deva ser o mesmo para o da adoção de restrições, ou seja, amparados em estudos científicos os mandantes podem editar normas menos tensas, reduzindo a intensidade das medidas que vedam determinadas atividades não essenciais.

Diante desse novo cenário legislativo acreditamos estar parte do Judiciário fundamentando suas decisões em enredo claudicante, quando provocado e especialmente em segunda instância, gerando manifesta insegurança jurídica a população.

Caro leitor, tome “minha ignorância por boa vontade, e creia bem por certo que, para aformosear nem afear, não porei aqui mais do que aquilo que vi e me pareceu.” [3] sobre o tema e as afirmações até aqui feitas e as que seguirão.

E sustentamos ser o posicionamento do Poder Judiciário vacilante quando escorado nas seguintes máximas: “não cabe ao Poder Judiciário interferir no mérito da decisão de reabertura das atividades econômicas e demais medidas para criação de isolamento social, pois são de competência do governador” [4]; ou “ainda que, na condição de poder eleito pela população, é o Executivo que tem a autoridade para gerir a crise provocada pela pandemia do novo coronavírus.”, cabendo a esse decidir sobre a retomada econômica [5].

Some-se ao contexto o fato de que há governantes decretando estado de calamidade pública ao mesmo passo que baixam decretos flexibilizando mais e mais atividades entabuladas como não essenciais.

Pois bem, ousamos discordar dos argumentos decisórios noticiados e acima transcritos, fazendo-o com amparo na decisão a que chegou a Corte Suprema por ocasião do exame da já referida ADI nº 6341.

Tal discordância se dá sob o entendimento de que os ‘alcaides’ não estão proibidos de tomar medidas mais flexíveis e de ordem econômica diante do estado de vigilância sanitária vivenciado. Podem sim, desde que suas medidas legislativas de relaxamento estejam fundamentadas em robusto estudo científico, conforme determinou o Supremo Tribunal Federal.

Ora, colocadas tais premissas, entendemos que o Poder Judiciário tem o dever, quando instado a tal, de julgar as demandas dessa ordem considerando as linhas diretivas postas pela Corte Suprema.

Ou seja, ao invés de esquivar-se no argumento de impossibilidade de interferência em outro Poder, que promova a exaustiva análise da lide e, caso o comando legislativo estadual ou municipal não esteja acompanhado dos obrigatórios dados científicos que os embase, que rechace o comando legal liberatório até que atendidas as diretrizes firmadas por ocasião do julgamento daquela ADI nº 6341.

Fonte: JOTA

Referências:
[1] in JOTA.Info https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/a-constituicao-o-supremo-e-a-competencia-concorrente-legislativa-13042020 , acessado em 10 de julho de 2020
[2] Informativo STF Nº 973
[3] trecho da carta de Pero Vaz de Caminha ao rei de Portugal por ocasião do Descobrimento do Brasil, in http://objdigital.bn.br/Acervo_Digital/livros_eletronicos/carta.pdf , acessado em 10 de julho de 2020
[4] TJDFT PJe2: 0722106-45.2020.8.07.0000, em Notícias © Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios – TJDFT
[5] Publicado em 20/05/2020 – 12:53 Por Felipe Pontes – Repórter da Agência Brasil – Brasília

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